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29 de setembro de 2007

Engana que eu gosto

Frei Betto*

Ora, é evidente que contra o senador não há "provas conclusivas", tudo não passou de gentileza do lobista de uma grande empreiteira. A contabilidade pecuária está em ordem, embora haja certa desordem na documentação pertinente.
Desde muito cedo o cidadão brasileiro é educado na síndrome do engano, enfermidade de etiologia política cuja cura só pode ser alcançada mediante doses maciças de auto-estima e senso cívico.
Os descobrimentos da América e do Brasil foram magníficos encontros de culturas transoceânicas. O saldo de milhões de indígenas mortos é mero acaso de organismos vulneráveis em suas defesas imunológicas às gripes e resfriados que os ibéricos contraíam em contato com as frias correntes marítimas.
A Casa Grande, generosa com os escravos, tratava-os como filhos, e uns tantos senhores, livres de todo preconceito, chegaram a mesclar seu sangue de branco ao prenhar negras e gerar o mestiço e este símbolo nacional chamada mulata.
Graças à benevolência da Casa Grande é que a senzala, farta de carnes variadas, brindou-nos com o prato de preferência nacional: a feijoada. E que não se olvide o bom-gosto do caipira, inventor deste coquetel que, hoje, conquista o sabor mundial: a caipirinha.
A rebelião de Vila Rica não passou de uma transposição extemporânea, ao solo pátrio, das idéias iluministas em voga na Europa. O bando de intelectuais, surpreendidos em sublevação contra a Coroa, fez de um alferes boi de piranha. Tanto que outro qualificativo eles não mereceram senão o de inconfidentes, incapazes de guardar confidência, segredo. À exceção do que teve o pescoço enforcado, deduraram uns aos outros. Hoje, o evento passaria à história como Deduragem Mineira.
E a Guerra do Paraguai? Foi lá o nosso Exército pacificar aquele povo iludido pela mente insana de um caudilho raivoso disposto a defender valores anacrônicos: a soberania nacional e os direitos sociais. Tamanha a paz que os nossos militares impuseram à nação vizinha, que apenas em cemitérios se pode encontrar tanta quietude.
Em Canudos, um bando de fanáticos, liderado por um fundamentalista desmiolado, ousou contrapor-se à proclamação da República! Não tivesse aquela gente resistido à ação pacificadora do Exército, teriam todos sobrevivido e, ordeiramente, retornado ao sadio trabalho nas lavouras canavieiras.
Tantas proeminentes figuras em nossa bela história: Vargas, pai dos pobres; JK, 50 anos em 5; Jânio, o homem da vassoura; Collor, o caçador de marajás! Merece destaque a Revolução de 1964, que salvou o Brasil da ameaça comunista e imprimiu índices astronômicos ao nosso desenvolvimento. Vide a Transamazônica, a Ferrovia do Aço, o Mobral e o fim do analfabetismo! Se um bando de subversivos preferiu trocar canetas por armas, insatisfeitos com a hierarquia trasladada dos quartéis às ruas, não fizeram as Forças Armadas outra coisa senão reagir em defesa da lei e da ordem.
Assim, de engano em engano, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, transcorre a nossa história. Ela que avança em ciclos de prosperidade, do pau-brasil ao ouro, do café à cana-de-açúcar, do minério à madeira amazônica, da soja à carne e, agora, retorna aos canaviais, de onde jorra o etanol, a bola da vez a oferecer ao mercado externo.
Sabemos todos que a verdade é inconveniente, incômoda, constrangedora. É melhor esse jeitinho elitista, capaz de acomodar as situações mais conflitivas e adotar, em nossas escolas, a versão cordial sobre o povo brasileiro. Povo pacífico, ordeiro, leal, com exceção de uns poucos que enxergam mensalão onde houve apenas "operações não contabilizadas". E ainda querem avacalheirar o presidente do Senado!
Engana que eu gosto!, diz a nação. Porque não há reação, não há manifestações nem mobilizações. Cadê as lideranças populares, as centrais sindicais, as pastorais proféticas? Fora um ou outro protesto ou gesto de indignação, tudo permanece como dantes no quartel de Abrantes.
Razão tinha Proust que, em Sodoma e Gomorra, escreveu: "No mundo da política as vítimas são tão covardes que não se consegue considerar os algozes maus por muito tempo".
[Autor de "A mosca azul - reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros."Sobre a Esperança" é o título do novo livro da editora Papirus (já nas livrarias) que contém um diálogo em torno do tema entre Frei Betto e o professor de Ciências da Religião Mário Sérgio Cortella. O lançamento será no dia 19 de dezembro, quarta, às 19h, no MAM (Museu de Arte Moderna), Parque Ibirapuera São Paulo].

*Frei dominicano.


28 de setembro de 2007

O criminal bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba. Até quando?

Tirso W. Sáenz*

Durante mais de 40 anos Cuba é vítima do bloqueio econômico, comercial e financeiro - o mais prolongado e cruel que tenha conhecido a História da Humanidade - imposto pelo governo dos Estados Unidos. O mundo inteiro conhece desta situação. Inúmeras instituições e organizações, intelectuais, políticos, operários e homens de todas a raças e de diversos credos políticos e religiosos de todo o mundo alçam continuadamente sua voz de protesto contra este crime. Inclusive a comunidade internacional, na Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou, uma vez mais, por esmagadora maioria, em novembro de 2006, uma resolução solicitando o fim do bloqueio.
Por que o bloqueio? Muitas pessoas bem intencionadas não podem compreender como a auto-intitulada "maior democracia no mundo" possa cometer tal agressão contra uma pequena nação do terceiro Mundo. Qual foi seu gravíssimo pecado?
O pecado foi fazer uma Revolução verdadeira, fazer uma Reforma Agrária, recuperar seus recursos naturais de mãos, principalmente, norte-americanas; eliminar o analfabetismo; dar educação e saúde a todo o povo; terminar com o domínio neo-colonial imposto pelos Estados Unidos durante mais de meio século; dar um sentimento próprio de soberania e orgulho nacional; e praticar o internacionalismo e a solidariedade internacional. Essas eram legítimas aspirações de todo o povo cubano desde suas lutas pela independência desde o século XIX.
Isso não podia ser permitido pelos governantes norte-americanos. A Revolução Cubana tinha que ser derrocada por qualquer via. Vejamos um memorando discutido numa reunião chefiada pelo Presidente dos Estados Unidos em abril de 1960:
"Não existe uma oposição política efetiva em Cuba; portanto, o único meio previsível que temos hoje para alienar o apoio interno à Revolução é através do desencantamento e do desânimo, baseados na insatisfação e nas dificuldades econômicas. Deve utilizar-se sem demora qualquer meio concebível para debilitar a vida econômica de Cuba. Negar dinheiro e fornecimentos a Cuba para diminuir os salários reais e monetários visando causar a fome, o desespero e a derrocada do governo".
Essa foi a origem do bloqueio. Além disso: agressões armadas como as de Baía dos Porcos e o financiamento a bandas armadas infiltradas no país, sabotagens a indústrias e centros comerciais, terrorismo - como a explosão da bomba no avião cubano que decolou de Barbados e que matou mais de 80 pessoas. Seus autores passeiam livremente pelas ruas de Miami. Ao mesmo tempo, cinco heróis cubanos sofrem injustas e longas condenações, presos nos EE. UU. por se infiltrarem na máfia anticubana de Miami para debelar seus intentos terroristas.
Apesar dos reclamos da comunidade internacional, o governo Bush adotou novos planos e sanções econômicas como mostra o relatório preparado pelo Governo de Cuba às Nações Unidas: intensificaram a perseguição a empresas e às transações financeiras internacionais de Cuba, incluídas aquelas para pagamentos aos organismos das Nações Unidas; roubaram marcas comerciais, como as reconhecidas Havana Club e Cohiba; novas cifras milionárias dos fundos cubanos congelados nos Estados Unidos; adotaram maiores represálias contra os que comerciam com a Ilha ou vinculam-se a ela a partir de intercâmbios de natureza cultural ou turística; aplicaram maiores pressões sobre os seus aliados para forçá-los a subordinar as relações com Cuba aos objetivos de "mudança de regime" que norteiam a política de hostilidade dos Estados Unidos; e impuseram uma escalada sem precedentes no apoio financeiro e material às ações que visam a derrocada da ordem constitucional cubana. Nesse relatório (1) se mostram de forma detalhada e precisa os diferentes atos cometidos na aplicação do bloqueio contra Cuba e as medidas adicionais do governo Bush. Vejamos alguns poucos exemplos:
-•No dia 5 de agosto de 2006, visando intensificar a promoção da subversão interna, iniciaram-se as transmissões diárias de "TV Martí" desde um novo avião tipo G-1, que opera de segunda-feira a sexta-feira, das 18h às 23h; uma vez por semana, continuam os sobrevôos do avião militar EC-130J do Pentágono; o Escritório de Transmissões para Cuba (OCB) empregou 10 milhões de dólares para estimular este projeto. Além disso, a OCB alugou no mês de dezembro desse mesmo ano um espaço durante 6 meses em duas emissoras de Miami por um montante de 377 mil e 500 dólares para. Para essas ações, o Governo dos Estados Unidos alocou aproximadamente 37 milhões de dólares.
-•No dia 4 de maio de 2007, a empresa inglesa PSL Energy Services foi multada com um montante de 164 mil dólares por exportar e re-exportar, sem licença dos EUA, equipamento de serviço de campos petrolíferos e serviços técnicos para Cuba.
- Cuba se vê forçada a comprar arroz e grãos num volume que ultrapassa o requerido, o que obriga a maiores capacidades de armazenamento. Sem o bloqueio, poderia importá-los em curtos prazos dos Estados Unidos. No ano 2006, os excedentes desses produtos foram estimados em 28 milhões 829 mil dólares, incorrendo num gasto adicional de 5 milhões 765 mil dólares para manter esses inventários. Além disso, o armazenamento durante um período tão prolongado, nas condições de um clima tropical, provocou perdas, por pragas, de aproximadamente 189 mil 642 dólares.
- O atendimento às crianças cubanas na esfera da anestesia cirúrgica é obstaculizado pelo bloqueio. Cuba não pode adquirir o agente anestésico inalante Sevoflurane patenteado com o nome comercial Sevorane, que se tornou um agente de indução por excelência para a anestesia geral em crianças. Essa patente é exclusiva dos Laboratórios ABBOT, companhia estadunidense que não comercializa com nosso país em cumprimento às leis do bloqueio. O Sistema Cubano de Saúde não tem outra alternativa que utilizar substitutos desse produto, com menor qualidade, em mercados mais longínquos e com o correspondente aumento dos custos.
- Os usuários da Internet em Cuba não podem ter acesso aos serviços gratuitos do Google Earth no endereço
http://earth.google.com . Ao tentar ter acesso recebe-se a seguinte resposta: "This product is not available in your country" (Este produto não se encontra disponível em seu país). Igualmente acontece com a atualização dos programas antivírus.
- A importação de matérias-primas, materiais e equipamentos de uso escolar para assegurar o processo docente educativo, como meios audiovisuais, computadores, equipamento de laboratório, reagentes, etc.,. foi seriamente afetada. Cada dia se reduzem mais os intermediários que correm o risco de realizar transações com Cuba pela ameaça das penalidades impostas pelo bloqueio. Tudo isto faz com que aumentem 20% e inclusive 100% nalguns casos, os preços dos produtos que se devem adquirir.
- Mais uma vez, foi negado aos artistas cubanos o direito a participar nas cerimônias dos prêmios Grammy e Grammy Latino. O visto foi denegado a seis dos artistas convidados, por razões descritas das regulamentações migratórias dos Estados Unidos, segundo a qual se proíbe a entrada nos Estados Unidos a qualquer indivíduo cuja entrada seja prejudicial aos interesses desse país. Também foi negado o visto a 15 cineastas cubanos.
- Estima-se que em 2006 o comercio exterior cubano foi afetado pelo bloqueio em valores que ultrapassaram os 1,305 bilhões de dólares. Os maiores impactos registraram-se pela impossibilidade de aceder ao mercado dos EUA. As importações que Cuba realiza não encareceram apenas como resultado de maiores preços, da utilização de intermediários e da necessidade de triangulação para determinados produtos, mas também pelo transporte desde mercados mais longínquos, com o conseqüente aumento dos fretes e seguros.
- O dano econômico direto causado ao povo cubano pela aplicação do bloqueio, em cálculos estimados, ultrapassou os 89 bilhões de dólares. Esta cifra não inclui os danos diretos ocasionados a objetivos econômicos e sociais do país pelas sabotagens e atos terroristas instados, organizados e financiados dos Estados Unidos.Também não inclui o valor dos produtos deixados de produzir ou os danos derivados das onerosas condições creditícias impostas a Cuba.Além disso, segundo a chamada Lei Helms-Burton que internacionaliza unilateralmente o bloqueio a Cuba, fica proibido:
- Que subsidiárias norte-americanas sediadas em terceiros países realizem qualquer tipo de transação com empresas em Cuba.
- Que empresas de terceiros países exportem para os Estados Unidos produtos de origem cubana ou produtos que na sua elaboração contenham algum componente dessa origem.
- Que empresas de terceiros países vendam bens ou serviços a Cuba, cuja tecnologia contenha mais do que 10% de componentes estadunidenses, ainda que os seus proprietários sejam nacionais desses países.
- Que entrem nos portos estadunidenses navios que transportem produtos desde ou para Cuba, independentemente do país de matrícula.
- Que bancos de terceiros países abram contas em dólares norte-americanos a pessoas jurídicas ou naturais cubanas ou realizem transações financeiras nessa moeda com entidades ou pessoas cubanas.
- Que empresários de terceiros países realizem investimentos ou negócios com Cuba em propriedades vinculadas às reclamações de cidadãos estadunidenses ou que, havendo nascido em Cuba, adquiriram essa cidadania.
Os cubanos, durante mais de 40 anos, têm padecido, sobrevivido e desenvolvem-se nas condições particularmente difíceis que lhes impõe a única superpotência, que procura o aniquilamento da resistência e do exemplo de dignidade e soberania da nação cubana.
Quando se vêem estas atrocidades do governo norte-americano aplicando políticas genocidas e terroristas contra o valoroso e sofrido povo cubano, compreende-se a hipocrisia dos governos norte-americanos que brindaram toda cooperação à sanguinária ditadura de Batista em Cuba, que brindaram todo apoio a seus aliados: as ditaduras de Brasil, Chile, Argentina, Nicarágua, Uruguai, Paraguai, Guatemala e El Salvador. Nenhuma delas foi bloqueada.
Quando terminará este bloqueio contra Cuba? Não é possível predizer. Cuba seguirá avançando na saúde pública, na educação, na economia, nas conquistas sociais, no espírito patriótico e de solidariedade do seu povo e seguirá resistindo "Até a Vitória, Sempre".
Brasília, 22 de setembro de 2007.


Nota:
(1) O relatório completo pode ver-se em
http://embacu.cubaminrex.cu/Default.aspx?tabid=2236
* Pesquisador Associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade de Brasília (UNB)

27 de setembro de 2007

uma pequena poesia

"Ando pelas ruas como se foce cega fugindo da verdade que me persegue da tristeza que me consome do ar que me polui com medo da vida, tento seguir o caminho das estrelas para achar alguma razão, para voltar a viver"


26 de setembro de 2007

É tempo de celebrar! Feliz Primavera!

Elaine Tavares*

Os povos pagãos, nas suas culturas, sempre me pareceram mais sábios. Eles tinham como costume celebrar a vida nos equinócios e solstícios, rendendo homenagens às estações. E isso não era coisa à toa. É porque cada estação traz com ela suas bênçãos. No girar desta bola azul, as comunidades vão experimentando a beleza do outono, a introspecção do inverno, a volúpia do verão e a alegria da primavera. É ainda nesse lento rodopiar que a terra e as gentes vão encontrando seu momento de plantar, colher, descansar e dançar.
Pois hoje, nesta nossa parte do mundo, é o equinócio da primavera. No ritmo das estações, tudo começa a vicejar. A voz dos passarinhos fica mais forte, as flores embestam a aparecer e, a despeito de todas as dores e lutas, também as pessoas parecem florescer em festa.
Aqui estamos nós no imenso jardim vendo cada coisa que plantamos no inverno, apontar pela terra afora. Então é hora de dançar a dança dos deuses, fazer "pago a Pacha Mama", reverenciar Inti (o sol), saudar Ñanderu, o grande pai Guarani, que com Jacy e Kuaray tornam esse mundo tão belo. É tempo de dizer o nome da beleza para que ela nos tome inteira como crêem os Navajos.
Um dia, bem longe, os povos do leste invadiram nossa Tekoá (terra-casa) e soterraram a cultura autóctone, trazendo novo deus e desconhecidos santos. Mas, sempre é tempo de recuperar nossa condição primeira, de povo de Abya Yala, e retomar velhos rituais. A caminhada dos tempos já tratou de mostrar que na profusão de deuses e deusas que co-existem nas mais variadas culturas, o que fica como certeza final é de que esta terra é sagrada e cabe a nós cuidar para que ela siga firme, com saúde e um lugar bom de viver. A Eko Porã do povo Guarani (terra boa e bonita para todos).
Esse tempo ainda não vingou, proliferam as guerras, as gentes precisam migrar de um lado para outro buscando sobreviver em meio à destruição do capital. Mas, em cada ser que vive, brilha a indefectível esperança. Dia virá em que todos poderão dançar para Inti, Pacha Mama, Viracocha, Quetzalcoalt, Istsá Natlehi, Wakan Tanka, Krisna, Jesus, braços dados, irmãos. E a terra será bela, e o banquete repartido. Paraíso. Socialismo. Eko Porã.
Enquanto isso, celebremos, pois. Os passarinhos nos chamam, as flores perfumam a vida e nós temos a obrigação de render graças. Porque nada no mundo pode ser melhor que caminhar na direção da beleza, da vida plena, da alegria, da Eko Porã. Em meio à tormenta, cantamos, dançamos e plantamos jardins porque confiamos, como Jeremias, diante da sua terra arrasada, que ainda vingarão flores neste lugar...


Feliz primavera! Viva Abya Yala..

*Jornalista


25 de setembro de 2007

Memórias de Alice

Frei Betto*

Se me é dado recordar, puxo lá no fundo da memória. Só deslembranças mais profundas, as que se refugiam atrás do inconsciente, carregadas de dor, revestidas de traumas, que preferem se esconder nos recantos mais obscuros do olvido. Porque outras eu sei guardar na lembrança. São as que permanecem tatuadas no coração, enraizadas no cipoal de sentimentos, impregnadas na superfície da pele.


Já viu, Alice, alguém esquecer o calor das mãos amadas, o beijo afetuoso, o olhar acolhedor, o sorriso de alvíssaras? Rodam-me a gargalhada do avô, ouvir a piada contada pelo tio, observando a espuma subir no copo enquanto a cerveja descia; o cheiro apetitoso da quitanda de seu Nezinho, florida de verduras e colorida de legumes; o silvo agudo da roda pétrea do amolador de facas se anunciando na esquina.

Também jamais se me apagam as lembranças da infância, não todas, mas sim aquelas que me fizeram dar conta de mim, saber que eu sou eu, fatos, episódios, eventos que me serviram de espelho no qual refleti essa personalidade moldada no tecido cotidiano da vida. Porque a gente não nasce sabendo de si. Nasce exilado de si. A sabença vem aos poucos, vem pelo olhar do outro, vem pelo carinho acalentador, e também pelo golpe desferido na face, o horror, o grito ofensivo, a ferida aberta na alma pela ponta da maledicência.

Quando a linha invisível do espaço que nos cerca é feita de bem-querer, o nosso lado de dentro também se faz de generosidade. Mas quando são fios eletrizados a nos causar permanente tensão, somos impelidos a romper a linha, destroçá-la, na ânsia de liberdade ilimitada. Reside aí a fonte maligna de todas as guerras.

Quem nasce tropeçado tende a atropelar os demais. Essa memória negativa nem é conveniente, porque se abriga nas dobras da irrazão, na ponta áspera de nosso lado vulcânico, lá onde o limite do humano se desembesta em fera, no resgate ancestral, atávico, dos bichos medonhos que nos coabitam e constituem a mais profunda raiz genética do nosso ser.

Sabe, Alice, eu às vezes tenho medo de minhas memórias. Elas ficam guardadas em mim como se numa caixa muito bem trancada e cujas chaves joguei no mar. E não falo apenas das memórias retorcidas, as que expõem minha face disforme no espelho da alma, carregadas de culpa, não da culpa da transgressão, e sim da culpa da omissão, a que se reveste da máscara da indiferença, do descaso, como se a minha vida fosse um rio capaz de fluir sem prestar atenção aos afluentes. Falo também das lembranças saudáveis, luminescentes, gratificantes, as que exaltam o ego e nos delineiam a auto-estima. Porque não se me apraz olhar para trás. Não quero jamais ser o que fui, quero ser o que não fui, fiel à minha identidade mais profunda, a que se esconde nas cavernas secretas do meu ser e aspira pela transcendência.

Não sou de nostalgias, de reminiscências, de cavucar o passado para maldizer o presente. Sou de ânsias de futuro, movido a utopias. Contudo, prometi a você que contaria o que sucedeu naqueles anos sombrios. Você me disse que precisa saber, penetrar fundo os mistérios de sua própria família, recolher os cacos espalhados pelo passado e tentar reconstruir o mosaico. Assim, tantos estilhaços que hoje lhe pulverizam a memória talvez se reajuntem e formem um conjunto conexo, um bordado que, ainda pelo avesso, só exibe linhas desarmônicas, entrecruzadas, impedindo-a de contemplar o desenho configurado do outro lado.

Hoje você completa 20 anos. E é preciso que se saiba neta de um herói. Seu avô são todos aqueles que abandonaram as salas de aula e ousaram enfrentar uma ditadura militar munidos de idealismo, generosidade, confiança em si e no futuro. Graças a eles, Alice, você agora não precisa olhar para trás nas ruas, nem desconfiar do colega de curso ou do vizinho a espreitar-lhe pela janela, e tentar adivinhar o que significam tantas receitas estampadas nos jornais e temer o carro de polícia cuja sirene lhe afoga os ouvidos às suas costas.

Alice, felicidade é não se envergonhar da própria história e cultivar, nos campos profícuos da subjetividade, amorosas orquídeas irrompidas, como por milagre, nos troncos ásperos dessa conflitiva existência.


[Autor de "Batismo de Sangue" (Rocco), entre outros livros]
*Frei dominicano.

24 de setembro de 2007

Pra começar a semana inspirada!

Silêncio Amoroso
"Preciso do teu silêncio cúmplice sobre minhas falhas. Não fale.Um sopro, a menor vogal pode me desamparar. E se eu abrir a boca minha alma vai rachar.O silêncio, aprendo, pode construir. É um mododenso/tenso - de coexistir. Calar, às vezes, é fina forma de amar."

Affonso Romano de Sant'Anna



21 de setembro de 2007

O caminho para Samarra


Leonardo Boff*

Um soldado da antiga Bassora, na Mesopotânia, cheio de medo, foi ao rei e lhe disse: "Meu Senhor, salva-me, ajuda-me a fugir daqui; estava na praça do mercado e encontrei a Morte vestida toda de preto que me mirou com um olhar mortal; empresta-me seu cavalo real para que possa correr depressa para Samarra que fica longe daqui; temo por minha vida se ficar na cidade". O rei fez-lhe a vontade. Mais tarde o rei encontrou a Morte na rua e lhe disse: " O meu soldado estava apavorado; contou-me que te encontrou e que tu o olhavas de forma estranhíssima". "Oh não", respondeu a Morte, "o meu olhar era apenas de estupefação, pois me perguntava como esse homem iria chegar a Samarra que fica tão longe daqui, porque o esperava esta noite lá".
Essa estória é uma parábola da aceleração do crescimento feito à custa da devastação da natureza e da exclusão das grandes maiorias. Ele nos está levando para Samarra. Em outras palavras: temos pouquíssimo tempo à disposição para entender o caos no sistema-Terra e tomar as medidas necessárias antes que ela desencadeie conseqüências irreversíveis. Já sabemos que não podemos mais evitar o aquecimento global, apenas impedir que seja catastrófico. No âmbito dos governos, não se está fazendo nada de realmente significativo que responda à gravidade do desafio. Muitos crêem na capacidade mágica da tecno-ciência: no momento decisivo ela seria capaz de sustar os efeitos destrutivos. Mas a coisa não é bem assim. Há danos que uma vez ocorridos produzem um efeito-avalanche.
A natureza no campo físico-químico e mesmo as doenças humanas nos servem de exemplo. Uma vez desencadeada, não se pode mais bloquear uma explosão nuclear. Rompidos os diques de Nova Orleans nos USA, não é mais possível frear a invasão do mar. Na maioria das doenças humanas ocorre a mesma lógica. O abuso de álcool e de fumo, o excesso na alimentação e a vida sedentária começam a princípio produzindo efeitos sem maior significação. Mas o organismo lentamente vai acumulando modificações, primeiramente funcionais, depois orgânicas e, por fim, atingindo certo patamar, surge uma doença não mais reversível.
É o que está ocorrendo com a Terra. A "colônia" humana em relação ao organismo-Terra está se comportando como um grupo de células que, num dado momento, começa a se replicar caoticamente, a invadir os tecidos circundantes, a produzir substâncias tóxicas que acaba por envenenar todo o organismo. Nós fizemos isso, ocupando 83% do planeta.O sistema econômico e produtivo se desenvolveu já há três séculos sem tomar em conta sua compatibilidade com o sistema ecológico. Hoje nos damos conta de que ecologia e modo industrialista de produção que implica o saque desertificante da natureza são contraditórios. Ou mudamos ou chegaremos à Samarra, onde nos espera algo sinistro.
A Terra como um todo é a fronteira. Ela coloca em crise os atuais modos de produção que sacrificam o capital natural e as formações sociais construídas sobre o consumismo, o desperdício, o mau trato dos rejeitos e a exclusão social. Três problemas básicos nos afligem: a alimentação que inclui a água potável, as fontes de energia e a superpopulação. Para cada um destes problemas não temos soluções globais à vista. E o tempo do relógio corrre contra nós. Agora é o momento de crise coletiva que nos obriga a pensar, a madurar e a tomar decisões de vida ou de morte.

*Teólogo e professor emérito de ética da UERJ

19 de setembro de 2007

A privatização do setor elétrico está (sorrateiramente) de volta?

Frei Betto*

Não há dúvida de que, no governo Lula, a malha de transmissão de energia elétrica cresceu muito mais do que em qualquer outro. "Nunca na história deste pais" se investiu tanto no setor. Isso é positivo e garante o fornecimento de energia elétrica às diversas regiões do país. O consumidor, hoje, ganha. Ganhará sempre?
O governo federal promove, via ANEEL, leilões para expandir o sistema de transmissão elétrica do país. Nos cinco leilões entre 2000 e 2002 (era FHC), o deságio baixíssimo assegurou altos rendimentos às empresas privadas. Em média, lucravam 20% sobre o valor do investimento. E não se permitia que empresas estatais, como Furnas, participassem dos leilões. O governo impediu Furnas de participar dos leilões das linhas de transmissão Ouro Preto-Vitória, Norte-Sul2, Itumbiara-Marimbondo etc.. Quando Furnas obteve permissão de participar foi porque não houve interesse do capital privado. E a estatal saiu no lucro.
Agora, no governo Lula, os ágios dos seis leilões subiram de 30 a 50%, esfriando a farra dos elevados ganhos do setor privado. As empresas arremataram linhas a serem construídas por preços bem menores do que se fazia no passado, e muito abaixo do preço de referência da ANEEL.
Bom para o consumidor brasileiro que, todo mês, paga na conta os custos de geração, transmissão e distribuição de energia, e mais os impostos embutidos. O que também favorece a competição entre as empresas do setor. Entretanto, o filé mignon fica com as grandes empresas espanholas (Abengoa, Isolux, Elecnor, Cobra e Cymi), e a colombiana Isa.
No setor de transmissão os riscos do investidor são pequenos. Em média, as grandes linhas de transmissão leiloadas são construídas em cerca de 20 meses. É rápido o retorno do capital investido. Já as hidrelétricas exigem anos de estudos, questões complexas de compensação ambiental, e tempo de construção de 3 anos, para as pequenas, e 5 para as médias; ou mais, para as gigantes, como a do Rio Madeira.
Este retorno financeiro, calculado, está embutido no lance do leilão. O ganhador, a curtíssimo prazo, já começa a receber seu capital de volta, em prestações mensais garantidas por 30 anos (antes corrigidas pelo IGPM e, agora, pelo IPCA). Daí a entrada maciça de empresas estrangeiras.
Essas empresas podem ser financiadas diretamente pelo BNDES (desde 2003 já captaram cerca de R$ 5,5 bilhões); contratar a si mesmas na execução das obras e negociar preços; refinanciar o capital próprio (equity) investido no empreendimento (o BNDES financia cerca de 70%; a empresa entra com 30% - podendo obter financiamento fora do Brasil); atuar em bloco (quem vai controlá-las?) e, se desejarem, não operar as linhas ganhas, negociando-as.
Já as empresas do setor elétrico estatal não têm liberdade para negociar com seus fornecedores de serviços e equipamentos, pois se regem pela lei de licitações, a Lei 8666. Tudo que fazem deve ser público e transparente. E Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf estão proibidas, pelo governo, de serem financiadas diretamente pelo BNDES. Se quiserem obter financiamento do BNDES, devem se associar a empresas privadas na proporção de 49% para as estatais e 51% para as privadas!
É a desestatização anunciada, a prazo, mas certa, do setor de transmissão, a espinha dorsal do setor elétrico brasileiro. As linhas ficarão em mãos de empresas privadas ou mistas (sob controle do capital privado).
Já as pequenas linhas estão ao alcance das estatais, que podem adquiri-las com capital próprio. Um fenômeno curioso: uma estatal federal pode se associar a uma estatal estadual - desde que esta detenha 51%. A Cemig, majoritária, e Furnas, minoritária, ganharam juntas a pequena linha de transmissão (75 km) entre a usina de Furnas e a cidade de Pimenta (MG). É o que resta às estatais. Com capital próprio, Furnas controla apenas linhas de transmissão pequenas, como a de Campos-Macaé (92 km) e a Tijuco Preto-Itapeti-Nordeste (50 km).
A privatização soma-se à desnacionalização
O que o consumidor gostaria de entender é por que as estatais federais são minoritárias nas grandes linhas? A resposta, simples, é de fazer corar quem esperava do PT um governo minimamente nacionalista: não se permite que sejam financiadas pelo BNDES. E não podem captar dinheiro fora do país, como fazem as transnacionais. Assim, sobra às empresas federais apenas a possibilidade de, nos leilões, fazerem lances, com capital próprio, em linhas pequenas.
Entre 2000 e 2002, foram realizados investimentos no setor de transmissão da ordem de R$ 3,8 bilhões, com deságios mínimos. À época, empresas estrangeiras obtiveram 49% das linhas leiloadas; as empresas privadas brasileiras, 36%; as parcerias estatais/privadas, 15%. As estatais, sozinhas, abocanharam apenas 13,5% dos trechos leiloados.
Já entre 2003 e 2006, quando os investimentos totalizaram cerca de R$ 9,5 bilhões, as empresas estrangeiras avançaram para 65% dos trechos leiloados. As associações de empresas estatais e privadas (estas sempre majoritárias) alcançaram 25% das linhas. As estatais recuaram e as empresas nacionais não agüentaram a concorrência.
Uma análise dos leilões de 2006, onde os investimentos foram de R$ 1,8 bilhão, mostra que as empresas estrangeiras conseguiram vencer em 84% dos trechos de linhas de transmissão leiloados.
Ora, graças às estatais, o Brasil construiu, com absoluto sucesso, um dos maiores sistemas de produção, transmissão e distribuição de energia elétrica do mundo. A concorrência, como está agora, é desigual. As estatais concorrem com as empresas privadas sem igualdade de condições. Estão perdendo terreno. Tudo indica que, a prazo, as estrangeiras dominarão o setor. O reflexo disso aparecerá no bolso do consumidor e na soberania do país: energia mais cara, e mais riqueza produzida aqui levada para o exterior pelas transnacionais.
[Autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros].


* Frei dominicano.

18 de setembro de 2007

Reflexões...

"Você pode descobrir mais sobre uma pessoa em uma hora de brincadeira do que em um ano de conversa." (Platão).

Constatei isso nesta semana, as pessoas se revelam... Por um lado é positivo, por outro é muito estanque... Por que não somos espontâneos a vida toda?!

"Nunca diga "te amo" se não te interessa. Nunca fale sobre sentimentos se estes não existem. Nunca toque numa vida se não pretende romper um coração. Nunca olhe nos olhos de alguém se não quiser vê-lo se derramar em lágrimas por causa de ti. A coisa mais cruel que alguém pode fazer é permitir que alguém se apaixone por você quando você não pretende fazer o mesmo."
(Mario Quintana)

Isso é muito sério mesmo! Sem querer julgar, mas vejo às vezes, alguns casais que banalizaram mesmo o "te amo". Dizem sem sentir... Fiquei pensando o quanto demorei a dizer "te amo", poucas pessoas ouviram de mim.

"Esses que puxam conversa sobre se chove ou não chove - não poderão ir para o Céu! Lá faz sempre bom tempo..."(Mario Quintana)

Amei essa frase, hoje que está chovendo então...

17 de setembro de 2007

Opinião dos outros....

Neste final de semana conversamos muito sobre o estilo de vida e as opções que algumas pessoas de nossa família e amigos fizeram...

Após pensar e falar algumas coisas eu me perguntei o seguinte, será que importa a nossa opinião??!!

Você se importa com a opinião que os outros têm a seu respeito?

Temos conhecidos que sofrem se não tiverem uma opinião alheia, parece que necessitam de uma confirmação pra realizar coisas!
No entanto, se a opinião dos outros sobre você é decisiva, vamos pensar um pouco sobre o quanto isso pode lhe ser prejudicial.
O primeiro sintoma de alguém que está sob o jugo da opinião alheia, é a dependência de elogios.
Se ninguém disser que o seu cabelo, a sua roupa, ou outro detalhe qualquer está bem, a pessoa não se sente segura.
Se alguém lhe diz que está com aparência de doente, a pessoa se sente amolentada e logo procura um médico.
Se ouve alguém dizer que está gorda, desesperadamente tenta diminuir peso.
Mas se disserem que é bonita, inteligente, esperta, ela também acredita.
Se lhe dizem que é feia, a pessoa se desespera. Principalmente se não tem condições de reparar a suposta feiúra com cirurgia plástica!!!
Existem pessoas que ficam o tempo todo à procura de alguém que lhes diga algo que as faça se sentir seguras, mesmo que esse alguém não as conheça bem.
Há pessoas que dependem da opinião alheia e se infelicitam na tentativa de agradar sempre.
São mulheres que aumentam ou diminuem seios, lábios, bochechas, nariz, para agradar seu pretendido. Como se isso fosse garantir o seu amor.
São homens que fazem implante de cabelo, modificam dentes, queixo, nariz, malham até à exaustão, para impressionar a sua eleita.
E, quando essas pessoas, inseguras e dependentes, não encontram ninguém que as elogie, que lhes diga o que desejam ouvir, se infelicitam e, não raro, caem em depressão.
Não se dão conta de que a opinião dos outros é superficial e leviana, pois geralmente não conhecem as pessoas das quais falam.
Não acredite em tudo o que falam a seu respeito. Não se deixe impressionar com falsos elogios, nem com críticas infundadas.
Seja você. Descubra o que tem de bom em sua intimidade e valorize-se. Ninguém melhor do que você para saber o que se passa na sua alma.
Procure estar bem com a sua consciência, sem neurose de querer agradar os outros, pois os outros nem sempre dão valor aos seus esforços.
A meditação é excelente ferramenta de auto-ajuda. Mergulhar nas profundezas da própria alma em busca de si mesmo é arte que merece atenção e dedicação.
Quando a pessoa se conhece, podem emitir dela as opiniões mais contraditórias que ela não se deixa impressionar, nem iludir, pois sabe da sua realidade.
Nesses dias em que as mídias tentam criar protótipos de beleza física, e enaltecer a juventude do corpo como único bem que merece investimento, não se deixe iludir.
Você vale pelo que é, e não pelo que tem ou aparenta ser.

O importante mesmo, é que você se goste. Que você se respeite. Que se cuide e se sinta bem.
A opinião de alguém só deve fazer sentido e ter peso, se esse alguém estiver realmente interessado na sua felicidade e no seu bem-estar.

Boa Semana!



16 de setembro de 2007

A Bacia de Pilatos

Leonardo Boff*

A nação está perplexa e indignada. Na cara da maioria dos políticos e, particularmente, dos jornalistas que acompanharam o caso do Senador Renan Calheiros e sabiam as manobras escusas que usava a partir de seu cargo de presidente da Casa, para se manter no poder, se estampava decepção e abatimento. E com razão, pois, o Senado se transformou num sinédrio, cheio de herodianos, aliados do poder dominante. Esses votaram a favor e 6 se abstiveram. Exatamente o número que Renan precisava para escapar-se da punição. Abster-se é dizer não à cassação. Supõe-se que muitos destes votos, secretos, vieram do PT e aliados. O Senador Mercadante revelou seu voto de abstenção. A líder do PT no Senado, Ildeli Salvati, cabalava votos em favor de Renan e deve ter se abstido, facilitando a vitória do acusado. A propósito de falta de decoro por permitir que um lobista pagasse suas contas pessoais referentes ao filho que tivera com sua amante ­ isso se chamava antigamente de adultério público - descobriram-se muitas outras irregularidades graves, atestadas pela polícia federal e pelo jornalismo investigativo da televisão. Esta foi ao local, em Alagoas, documentou em som e em cores as mentiras e falsas alegações de Calheiros o que comprovava ainda mais sua falta de decoro. Além do mais, mentiu aos Senadores e sonegou informações e documentos ao conselho de ética.Aliados do absolvido falaram em vitória da democracia. Que democracia? Esta, convencional no Brasil, encurtada e farsesca, montada em cima de conchavos, do uso do poder público em benefício próprio, infectada de tráfico de influência e de desvio de dinheiros públicos?O que envergonha os cidadãos é verem Senadores, alguns velhos provectos, sem qualquer dignidade, verdadeiros mafiosos do poder, voltarem as costas à sociedade e fazerem-se cegos e surdos ao clamor das ruas. Estão tão enjaulados em seus privilégios na redoma do Senado que nem lhes importa o que a mídia e a opinião pública pensam deles.Mas, o que envergonha mesmo é a recaída de membros do PT. São pecadores públicos contumazes. Já haviam antes enviado a ética nem sequer para o limbo, mas diretamente para o inferno. Agora repetiram o ato pecaminoso. Por isso, são desprezíveis como Pilatos. Este se acovardou diante do povo e condenou Jesus. Mas, antes fez um gesto que passou à história como símbolo de pusilanimidade, de covardia e de falta de caráter. Diante do povo, lavou as mãos com água. Essa bacia de Pilatos foi ressuscitada no Senado. Mas a água não é água. São lágrimas dos indignados, dos cansados de ver injustiças e dos dilacerados diante da contínua impunidade. A "onorebile famiglia Calheiros" tem novos membros em sua máfia. Todos os que se abstiveram, podem acrescentar a seus nomes o sobrenome de Calheiros. Como revelou publicamente seu voto, o Senador Aloísio Mercadante merece agora ser chamado de Aloisio Mercadante Calheiros. Pelo esforço da argumentação em favor da não cassação de Renan, a Senadora Ildeli Salvatti merece que lhe apodemos de Ideli Salvatti Calheiros. Ela fez a figura inversa da mulher do covarde Pilatos que o advertiu: "não te comprometas com este justo, pois sofri muito hoje em sonhos por causa dele". Ela e outros devem estar sofrendo muito, sim, roídos pela má consciência. Esse sofrimento transparece em seus olhos revirados e em seus rostos desfigurados.O povo não merece ser representado por espíritos menores, faltos de ética, desavergonhados e esquecidos de que são meros delegados do poder popular. Que mostrem a cara, que falem ao povo, que se expliquem por quê, diante de tantas provas dos relatórios da comissão de ética e do clamor das ruas, puderam agir de forma tão traiçoeira.


*Teólogo

14 de setembro de 2007


Desejo um final de semana cheio de cores e
com muito sabor pra todos vocês!!
ONU e Direitos dos Povos Indígenas

Azelene Kaingáng*

Assembléia Geral da ONU vota hoje (13 de setembro) a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas
A votação prevista para hoje, dia 13 de setembro, no plenário da Assembléia Geral das Nações Unidas poderá colocar um ponto final em mais de 20 anos de discussões e negociações entre representantes indígenas de todo o mundo e os Estados membros da ONU, sobre a Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas.
O texto da Declaração foi adotado em 2006, pelo recém criado Conselho de Direitos Humanos da ONU, porém ao ser remetido para a Assembléia Geral do mesmo ano, os Países africanos liderados por Botswana, Namíbia e Nigéria, apoiados por Estados Unidos, Canadá, Rússia, Nova Zelândia e Austrália, impediram a sua adoção sob o argumento de que tinham problemas com o texto, desde então, nos últimos 12 meses se levaram a cabo intensas negociações entre Povos Indígenas, Estados Amigos da Declaração, entre eles o Brasil, e os Países Africanos.
Finalmente, chegaram a um consenso depois de emendarem 4 (quatro) parágrafos preambulares e 5 (cinco) artigos dispositivos no texto da Declaração, no sentido de contemplar algumas das preocupações dos Estados em relação a sua soberania, integridade territorial, militarização, recursos naturais e o princípio do consentimento prévio, livre e informado.
Muitas Organizações Indígenas no mundo apóiam a adoção da Declaração, embora não concordem com as mudanças realizados pelos Estados, entendem que mesmo afetando algumas questões o texto preserva muito do que foi conquistado pelos Povos Indígenas durante o processo negociador.
É hora da ONU reconhecer a dívida histórica que os Países possuem para com os Povos Indígenas e manifestar esse reconhecimento através da adoção definitiva desse instrumento internacional de afirmação e garantia dos direitos humanos dos Povos Indígenas. A vida e o futuro de mais de 370 milhões de indígenas do mundo, depende da aprovação e da implementação da Declaração das nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
A Declaração além de plantar novas bases nas relações entre os Estados Nacionais e os Povos Indígenas, busca eliminar progressivamente a discriminação, a exclusão e o preconceito de que são vítimas esses Povos em todo o mundo, como conseqüência do processo de colonização que sofreram durante séculos. Prevê ainda a garantia dos direitos humanos fundamentais, como o respeito às diferenças culturais e às tradições, e também o direito de manter e fortalecer as suas próprias instituições políticas de decisão.


*Socióloga. Membro do Warã Instituto Indígena Brasileiro. Prêmio Nacional de Direitos Humanos 2006

Que este tipo de cena não se repita!! Aliás, esta foto é da comemoração do 500 anos do BRASIL!!!!!

No dia 11 de setembro minha mãe estava de niver.
Comemoramos dia 12, quarta, com um belo pastelão...
Meu irmão, esse da foto, nos proporcionou momentos de risos com
suas caretas... Ô Paulinho!








Hoje recebi notícias da Melissa, filha da Mariglei. Está cada vez mais fofa!!! Cada
vez que minhas amigas me mandam foto de seus filhos me dá um nervoso!!!
Vejo como o tempo passou, alguns anos atrás tínhamos vergonha de namorar!!!!!!!!!!
Mas é muito ver todo mundo "encaminhado", feliz e realizado com suas famílias!

Bom, hoje sexta-feira, finalmente terei um final de semana de folga...
Mais tarde escrevo mais!

13 de setembro de 2007

Homenagem às amigas

Minha amiga Magda adorou a imagem de "entrada" do blog. rsrsrs
Está ali em homenagem a Janice.
Lá em casa esses dias começou uma discussão sobre as tais "gorduras trans", me inspirei para pôr o nome no endereço do blog. Por quê? Olha a definição...

"As gorduras trans são um tipo especial de ácido graxo, formado a partir de ácidos graxos insaturados. Em outros termos, são um tipo específico de gordura formada por um processo de hidrogenação natural (ocorrido no rúmen de animais) ou industrial. Estão presentes principalmente nos alimentos industrializados. Os alimentos de origem animal como a carne e o leite possuem pequenas quantidades dessas gorduras."

O pior vem agora...

"Estão presentes em muitos alimentos industrializados, como biscoitos, bolos confeitados e salgadinhos. A gordura trans é muito utilizada nestes produtos por aumentar sua validade e dar mais crocância, mas é extremamente nociva para o organismo. Embora alguma gordura trans seja encontrada na natureza (no leite e gordura de ruminantes como vaca e carneiro), por influência de uma bactéria presente no rumén desses animais, a maioria é formada durante a manufatura de alimentos processados."

TUDO QUE É GOSTOSO TEM ISSO!!!!!!!!

Janice, não tem saída... Dependemos das tais gorduras trans...

Lula

"Interessa é que o Senado volte a funcionar", diz Lula

Interessante como as coisas mudam... Pôxa que diferença de visão e opções do Lula.
Em pensar que já o acompanhei em seus discursos e visitas em minha cidade.
Decepcionante!

Bom, mas a vida tem que seguir...

As fases da lua


Frei Betto*

Muito cedo gravou-se em mim o sentimento do mundo. Meus olhos, dilatados pela fé, polidos pelo pós-hegelianismo de Marx, enxergaram a pirâmide social invertida. Consumiu-se minha juventude na embriaguez da utopia. Dela comungavam tantos companheiros e companheiras movidos pelo ardente desejo de morder a lua.
Épico o nosso sonho de remover as travas da desvida. Singular aquela estóica dedicação, despojada de toda ambição pessoal, disposta a reinventar o mundo. Tínhamos a ousadia de romper parâmetros, despidos de moralismos e sensíveis à morte e vida Severina. Lutávamos atentos aos clamores da Revolução de Outubro, à Longa Marcha de Mao ao cruzar as pontes de nossos corações, aos barbudos de Sierra Maestra que arrancavam baforadas de nosso alento juvenil, à vitória vietnamita selando-nos a certeza de que arrebataríamos o futuro. A lua seria o nosso troféu. Haveríamos de escalar suas montanhas e, lá em cima, desfraldar as bandeiras da socialização compulsória.
Os condenados da Terra arranchavam-se sob o caravansará de nossos ideais e, em breve, saberíamos conduzi-los aos mananciais onde correm leite e mel...
Caiu a noite, a lua se apagou, a nação, pisada pelas botas, abortou primícias e promessas. Trocamos a sala de aula pelo combate destemido, a caneta pelas armas, a garganta a ruminar convicta: "Venceremos!"
O terror do Leviatã se abateu sobre nós, os gritos de dor ecoaram das masmorras, vidas preciosas ceifadas no carrossel das sevícias, corpos despedaçados e desaparecidos nos labirintos do arbítrio. Ainda assim, a lua não sangrou.
Rumo à aurora, demos as mãos à multidão peregrina imbuída da devoção democrática. Nas periferias, o sorriso se abria, a consciência despertava, a mobilização florescia. Até que brilharam os raios fúlgidos e o esplendor da lua iluminou-nos a esperança.
Na oficina dos sonhos, forjamos ferramentas apropriadas ao parto do novo Brasil. A luta sindical consubstanciou-se em projeto partidário, a crença pastoral multiplicou-se em células comunitárias, os movimentos sociais emergiram como atores no palco dominado pelas sinistras máscaras dos que jamais conjugaram o verbo partilhar. Cuba, Nicarágua, El Salvador... o olhar impávido do Che... a irredutível teimosia de Gandhi... a sede de justiça dessedentada nas fontes límpidas da ética. Jamais seríamos como eles. Em tempos de chuva, a água sobe rápido e inunda ruas, casas, cidades. Cegos pela miragem, não percebemos o lento e imbatível sopro do vento. A areia fétida, acumulada à soleira da porta, dia após dia subia mais um palmo. Galgamos degraus investidos de mandato popular, fomos entronizados na cozinha de Maquiavel, havia chegado a hora de quem tanto esperou acontecer. Intrépidos, alguns de nós decidiram cavalgar soberbos, convencidos de que o caminho mais curto entre sonho e realidade passa pelo mágico som do tilintar das moedas.
Por que não se aventurar pelas mesmas sendas trilhadas pelo inimigo, já que ele se perpetua com tanta força? Qual o segredo dos cabelos de Sansão? Os pobres caíram no olvido, a sedução do poder fez a lua arder em chamas. Ícaros impenitentes, não se deram conta de que as asas eram de barro.
A sofreguidão esvaziou projetos, a gula cobiçosa devorou quimeras. O pragmatismo acelerou a epifania dos avatares do poder. O conluio enlaçou históricos oponentes, adversários coligaram-se, e aliados foram defenestrados nessa massa informe que, destemperada de ética, alicerça o Leviatã.
Ainda assim, há quem, sob a lua apagada, não tema perseguir pontos de luz na escuridão. Por alguma parte trafega a lanterna de Diógenes. Triste, contudo, ver antigos companheiros na condição de réus de tramóias eleitoreiras e financeiras.
Hoje, a história, estuprada pelo neoliberalismo, engravida-se de sonhos medíocres. A utopia escorre pelo ralo. A lua míngua, a estrela já não refulge.
Dói em mim tanto desacerto. Os sonhos de uma geração trocados por um prato de lentilha. Aguardo, agora, a lua nova.


[Autor de "A mosca azul - reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros].

*Frei dominicano.

29 de setembro de 2007

Engana que eu gosto

Frei Betto*

Ora, é evidente que contra o senador não há "provas conclusivas", tudo não passou de gentileza do lobista de uma grande empreiteira. A contabilidade pecuária está em ordem, embora haja certa desordem na documentação pertinente.
Desde muito cedo o cidadão brasileiro é educado na síndrome do engano, enfermidade de etiologia política cuja cura só pode ser alcançada mediante doses maciças de auto-estima e senso cívico.
Os descobrimentos da América e do Brasil foram magníficos encontros de culturas transoceânicas. O saldo de milhões de indígenas mortos é mero acaso de organismos vulneráveis em suas defesas imunológicas às gripes e resfriados que os ibéricos contraíam em contato com as frias correntes marítimas.
A Casa Grande, generosa com os escravos, tratava-os como filhos, e uns tantos senhores, livres de todo preconceito, chegaram a mesclar seu sangue de branco ao prenhar negras e gerar o mestiço e este símbolo nacional chamada mulata.
Graças à benevolência da Casa Grande é que a senzala, farta de carnes variadas, brindou-nos com o prato de preferência nacional: a feijoada. E que não se olvide o bom-gosto do caipira, inventor deste coquetel que, hoje, conquista o sabor mundial: a caipirinha.
A rebelião de Vila Rica não passou de uma transposição extemporânea, ao solo pátrio, das idéias iluministas em voga na Europa. O bando de intelectuais, surpreendidos em sublevação contra a Coroa, fez de um alferes boi de piranha. Tanto que outro qualificativo eles não mereceram senão o de inconfidentes, incapazes de guardar confidência, segredo. À exceção do que teve o pescoço enforcado, deduraram uns aos outros. Hoje, o evento passaria à história como Deduragem Mineira.
E a Guerra do Paraguai? Foi lá o nosso Exército pacificar aquele povo iludido pela mente insana de um caudilho raivoso disposto a defender valores anacrônicos: a soberania nacional e os direitos sociais. Tamanha a paz que os nossos militares impuseram à nação vizinha, que apenas em cemitérios se pode encontrar tanta quietude.
Em Canudos, um bando de fanáticos, liderado por um fundamentalista desmiolado, ousou contrapor-se à proclamação da República! Não tivesse aquela gente resistido à ação pacificadora do Exército, teriam todos sobrevivido e, ordeiramente, retornado ao sadio trabalho nas lavouras canavieiras.
Tantas proeminentes figuras em nossa bela história: Vargas, pai dos pobres; JK, 50 anos em 5; Jânio, o homem da vassoura; Collor, o caçador de marajás! Merece destaque a Revolução de 1964, que salvou o Brasil da ameaça comunista e imprimiu índices astronômicos ao nosso desenvolvimento. Vide a Transamazônica, a Ferrovia do Aço, o Mobral e o fim do analfabetismo! Se um bando de subversivos preferiu trocar canetas por armas, insatisfeitos com a hierarquia trasladada dos quartéis às ruas, não fizeram as Forças Armadas outra coisa senão reagir em defesa da lei e da ordem.
Assim, de engano em engano, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, transcorre a nossa história. Ela que avança em ciclos de prosperidade, do pau-brasil ao ouro, do café à cana-de-açúcar, do minério à madeira amazônica, da soja à carne e, agora, retorna aos canaviais, de onde jorra o etanol, a bola da vez a oferecer ao mercado externo.
Sabemos todos que a verdade é inconveniente, incômoda, constrangedora. É melhor esse jeitinho elitista, capaz de acomodar as situações mais conflitivas e adotar, em nossas escolas, a versão cordial sobre o povo brasileiro. Povo pacífico, ordeiro, leal, com exceção de uns poucos que enxergam mensalão onde houve apenas "operações não contabilizadas". E ainda querem avacalheirar o presidente do Senado!
Engana que eu gosto!, diz a nação. Porque não há reação, não há manifestações nem mobilizações. Cadê as lideranças populares, as centrais sindicais, as pastorais proféticas? Fora um ou outro protesto ou gesto de indignação, tudo permanece como dantes no quartel de Abrantes.
Razão tinha Proust que, em Sodoma e Gomorra, escreveu: "No mundo da política as vítimas são tão covardes que não se consegue considerar os algozes maus por muito tempo".
[Autor de "A mosca azul - reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros."Sobre a Esperança" é o título do novo livro da editora Papirus (já nas livrarias) que contém um diálogo em torno do tema entre Frei Betto e o professor de Ciências da Religião Mário Sérgio Cortella. O lançamento será no dia 19 de dezembro, quarta, às 19h, no MAM (Museu de Arte Moderna), Parque Ibirapuera São Paulo].

*Frei dominicano.


28 de setembro de 2007

O criminal bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba. Até quando?

Tirso W. Sáenz*

Durante mais de 40 anos Cuba é vítima do bloqueio econômico, comercial e financeiro - o mais prolongado e cruel que tenha conhecido a História da Humanidade - imposto pelo governo dos Estados Unidos. O mundo inteiro conhece desta situação. Inúmeras instituições e organizações, intelectuais, políticos, operários e homens de todas a raças e de diversos credos políticos e religiosos de todo o mundo alçam continuadamente sua voz de protesto contra este crime. Inclusive a comunidade internacional, na Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou, uma vez mais, por esmagadora maioria, em novembro de 2006, uma resolução solicitando o fim do bloqueio.
Por que o bloqueio? Muitas pessoas bem intencionadas não podem compreender como a auto-intitulada "maior democracia no mundo" possa cometer tal agressão contra uma pequena nação do terceiro Mundo. Qual foi seu gravíssimo pecado?
O pecado foi fazer uma Revolução verdadeira, fazer uma Reforma Agrária, recuperar seus recursos naturais de mãos, principalmente, norte-americanas; eliminar o analfabetismo; dar educação e saúde a todo o povo; terminar com o domínio neo-colonial imposto pelos Estados Unidos durante mais de meio século; dar um sentimento próprio de soberania e orgulho nacional; e praticar o internacionalismo e a solidariedade internacional. Essas eram legítimas aspirações de todo o povo cubano desde suas lutas pela independência desde o século XIX.
Isso não podia ser permitido pelos governantes norte-americanos. A Revolução Cubana tinha que ser derrocada por qualquer via. Vejamos um memorando discutido numa reunião chefiada pelo Presidente dos Estados Unidos em abril de 1960:
"Não existe uma oposição política efetiva em Cuba; portanto, o único meio previsível que temos hoje para alienar o apoio interno à Revolução é através do desencantamento e do desânimo, baseados na insatisfação e nas dificuldades econômicas. Deve utilizar-se sem demora qualquer meio concebível para debilitar a vida econômica de Cuba. Negar dinheiro e fornecimentos a Cuba para diminuir os salários reais e monetários visando causar a fome, o desespero e a derrocada do governo".
Essa foi a origem do bloqueio. Além disso: agressões armadas como as de Baía dos Porcos e o financiamento a bandas armadas infiltradas no país, sabotagens a indústrias e centros comerciais, terrorismo - como a explosão da bomba no avião cubano que decolou de Barbados e que matou mais de 80 pessoas. Seus autores passeiam livremente pelas ruas de Miami. Ao mesmo tempo, cinco heróis cubanos sofrem injustas e longas condenações, presos nos EE. UU. por se infiltrarem na máfia anticubana de Miami para debelar seus intentos terroristas.
Apesar dos reclamos da comunidade internacional, o governo Bush adotou novos planos e sanções econômicas como mostra o relatório preparado pelo Governo de Cuba às Nações Unidas: intensificaram a perseguição a empresas e às transações financeiras internacionais de Cuba, incluídas aquelas para pagamentos aos organismos das Nações Unidas; roubaram marcas comerciais, como as reconhecidas Havana Club e Cohiba; novas cifras milionárias dos fundos cubanos congelados nos Estados Unidos; adotaram maiores represálias contra os que comerciam com a Ilha ou vinculam-se a ela a partir de intercâmbios de natureza cultural ou turística; aplicaram maiores pressões sobre os seus aliados para forçá-los a subordinar as relações com Cuba aos objetivos de "mudança de regime" que norteiam a política de hostilidade dos Estados Unidos; e impuseram uma escalada sem precedentes no apoio financeiro e material às ações que visam a derrocada da ordem constitucional cubana. Nesse relatório (1) se mostram de forma detalhada e precisa os diferentes atos cometidos na aplicação do bloqueio contra Cuba e as medidas adicionais do governo Bush. Vejamos alguns poucos exemplos:
-•No dia 5 de agosto de 2006, visando intensificar a promoção da subversão interna, iniciaram-se as transmissões diárias de "TV Martí" desde um novo avião tipo G-1, que opera de segunda-feira a sexta-feira, das 18h às 23h; uma vez por semana, continuam os sobrevôos do avião militar EC-130J do Pentágono; o Escritório de Transmissões para Cuba (OCB) empregou 10 milhões de dólares para estimular este projeto. Além disso, a OCB alugou no mês de dezembro desse mesmo ano um espaço durante 6 meses em duas emissoras de Miami por um montante de 377 mil e 500 dólares para. Para essas ações, o Governo dos Estados Unidos alocou aproximadamente 37 milhões de dólares.
-•No dia 4 de maio de 2007, a empresa inglesa PSL Energy Services foi multada com um montante de 164 mil dólares por exportar e re-exportar, sem licença dos EUA, equipamento de serviço de campos petrolíferos e serviços técnicos para Cuba.
- Cuba se vê forçada a comprar arroz e grãos num volume que ultrapassa o requerido, o que obriga a maiores capacidades de armazenamento. Sem o bloqueio, poderia importá-los em curtos prazos dos Estados Unidos. No ano 2006, os excedentes desses produtos foram estimados em 28 milhões 829 mil dólares, incorrendo num gasto adicional de 5 milhões 765 mil dólares para manter esses inventários. Além disso, o armazenamento durante um período tão prolongado, nas condições de um clima tropical, provocou perdas, por pragas, de aproximadamente 189 mil 642 dólares.
- O atendimento às crianças cubanas na esfera da anestesia cirúrgica é obstaculizado pelo bloqueio. Cuba não pode adquirir o agente anestésico inalante Sevoflurane patenteado com o nome comercial Sevorane, que se tornou um agente de indução por excelência para a anestesia geral em crianças. Essa patente é exclusiva dos Laboratórios ABBOT, companhia estadunidense que não comercializa com nosso país em cumprimento às leis do bloqueio. O Sistema Cubano de Saúde não tem outra alternativa que utilizar substitutos desse produto, com menor qualidade, em mercados mais longínquos e com o correspondente aumento dos custos.
- Os usuários da Internet em Cuba não podem ter acesso aos serviços gratuitos do Google Earth no endereço
http://earth.google.com . Ao tentar ter acesso recebe-se a seguinte resposta: "This product is not available in your country" (Este produto não se encontra disponível em seu país). Igualmente acontece com a atualização dos programas antivírus.
- A importação de matérias-primas, materiais e equipamentos de uso escolar para assegurar o processo docente educativo, como meios audiovisuais, computadores, equipamento de laboratório, reagentes, etc.,. foi seriamente afetada. Cada dia se reduzem mais os intermediários que correm o risco de realizar transações com Cuba pela ameaça das penalidades impostas pelo bloqueio. Tudo isto faz com que aumentem 20% e inclusive 100% nalguns casos, os preços dos produtos que se devem adquirir.
- Mais uma vez, foi negado aos artistas cubanos o direito a participar nas cerimônias dos prêmios Grammy e Grammy Latino. O visto foi denegado a seis dos artistas convidados, por razões descritas das regulamentações migratórias dos Estados Unidos, segundo a qual se proíbe a entrada nos Estados Unidos a qualquer indivíduo cuja entrada seja prejudicial aos interesses desse país. Também foi negado o visto a 15 cineastas cubanos.
- Estima-se que em 2006 o comercio exterior cubano foi afetado pelo bloqueio em valores que ultrapassaram os 1,305 bilhões de dólares. Os maiores impactos registraram-se pela impossibilidade de aceder ao mercado dos EUA. As importações que Cuba realiza não encareceram apenas como resultado de maiores preços, da utilização de intermediários e da necessidade de triangulação para determinados produtos, mas também pelo transporte desde mercados mais longínquos, com o conseqüente aumento dos fretes e seguros.
- O dano econômico direto causado ao povo cubano pela aplicação do bloqueio, em cálculos estimados, ultrapassou os 89 bilhões de dólares. Esta cifra não inclui os danos diretos ocasionados a objetivos econômicos e sociais do país pelas sabotagens e atos terroristas instados, organizados e financiados dos Estados Unidos.Também não inclui o valor dos produtos deixados de produzir ou os danos derivados das onerosas condições creditícias impostas a Cuba.Além disso, segundo a chamada Lei Helms-Burton que internacionaliza unilateralmente o bloqueio a Cuba, fica proibido:
- Que subsidiárias norte-americanas sediadas em terceiros países realizem qualquer tipo de transação com empresas em Cuba.
- Que empresas de terceiros países exportem para os Estados Unidos produtos de origem cubana ou produtos que na sua elaboração contenham algum componente dessa origem.
- Que empresas de terceiros países vendam bens ou serviços a Cuba, cuja tecnologia contenha mais do que 10% de componentes estadunidenses, ainda que os seus proprietários sejam nacionais desses países.
- Que entrem nos portos estadunidenses navios que transportem produtos desde ou para Cuba, independentemente do país de matrícula.
- Que bancos de terceiros países abram contas em dólares norte-americanos a pessoas jurídicas ou naturais cubanas ou realizem transações financeiras nessa moeda com entidades ou pessoas cubanas.
- Que empresários de terceiros países realizem investimentos ou negócios com Cuba em propriedades vinculadas às reclamações de cidadãos estadunidenses ou que, havendo nascido em Cuba, adquiriram essa cidadania.
Os cubanos, durante mais de 40 anos, têm padecido, sobrevivido e desenvolvem-se nas condições particularmente difíceis que lhes impõe a única superpotência, que procura o aniquilamento da resistência e do exemplo de dignidade e soberania da nação cubana.
Quando se vêem estas atrocidades do governo norte-americano aplicando políticas genocidas e terroristas contra o valoroso e sofrido povo cubano, compreende-se a hipocrisia dos governos norte-americanos que brindaram toda cooperação à sanguinária ditadura de Batista em Cuba, que brindaram todo apoio a seus aliados: as ditaduras de Brasil, Chile, Argentina, Nicarágua, Uruguai, Paraguai, Guatemala e El Salvador. Nenhuma delas foi bloqueada.
Quando terminará este bloqueio contra Cuba? Não é possível predizer. Cuba seguirá avançando na saúde pública, na educação, na economia, nas conquistas sociais, no espírito patriótico e de solidariedade do seu povo e seguirá resistindo "Até a Vitória, Sempre".
Brasília, 22 de setembro de 2007.


Nota:
(1) O relatório completo pode ver-se em
http://embacu.cubaminrex.cu/Default.aspx?tabid=2236
* Pesquisador Associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade de Brasília (UNB)

27 de setembro de 2007

uma pequena poesia

"Ando pelas ruas como se foce cega fugindo da verdade que me persegue da tristeza que me consome do ar que me polui com medo da vida, tento seguir o caminho das estrelas para achar alguma razão, para voltar a viver"


26 de setembro de 2007

É tempo de celebrar! Feliz Primavera!

Elaine Tavares*

Os povos pagãos, nas suas culturas, sempre me pareceram mais sábios. Eles tinham como costume celebrar a vida nos equinócios e solstícios, rendendo homenagens às estações. E isso não era coisa à toa. É porque cada estação traz com ela suas bênçãos. No girar desta bola azul, as comunidades vão experimentando a beleza do outono, a introspecção do inverno, a volúpia do verão e a alegria da primavera. É ainda nesse lento rodopiar que a terra e as gentes vão encontrando seu momento de plantar, colher, descansar e dançar.
Pois hoje, nesta nossa parte do mundo, é o equinócio da primavera. No ritmo das estações, tudo começa a vicejar. A voz dos passarinhos fica mais forte, as flores embestam a aparecer e, a despeito de todas as dores e lutas, também as pessoas parecem florescer em festa.
Aqui estamos nós no imenso jardim vendo cada coisa que plantamos no inverno, apontar pela terra afora. Então é hora de dançar a dança dos deuses, fazer "pago a Pacha Mama", reverenciar Inti (o sol), saudar Ñanderu, o grande pai Guarani, que com Jacy e Kuaray tornam esse mundo tão belo. É tempo de dizer o nome da beleza para que ela nos tome inteira como crêem os Navajos.
Um dia, bem longe, os povos do leste invadiram nossa Tekoá (terra-casa) e soterraram a cultura autóctone, trazendo novo deus e desconhecidos santos. Mas, sempre é tempo de recuperar nossa condição primeira, de povo de Abya Yala, e retomar velhos rituais. A caminhada dos tempos já tratou de mostrar que na profusão de deuses e deusas que co-existem nas mais variadas culturas, o que fica como certeza final é de que esta terra é sagrada e cabe a nós cuidar para que ela siga firme, com saúde e um lugar bom de viver. A Eko Porã do povo Guarani (terra boa e bonita para todos).
Esse tempo ainda não vingou, proliferam as guerras, as gentes precisam migrar de um lado para outro buscando sobreviver em meio à destruição do capital. Mas, em cada ser que vive, brilha a indefectível esperança. Dia virá em que todos poderão dançar para Inti, Pacha Mama, Viracocha, Quetzalcoalt, Istsá Natlehi, Wakan Tanka, Krisna, Jesus, braços dados, irmãos. E a terra será bela, e o banquete repartido. Paraíso. Socialismo. Eko Porã.
Enquanto isso, celebremos, pois. Os passarinhos nos chamam, as flores perfumam a vida e nós temos a obrigação de render graças. Porque nada no mundo pode ser melhor que caminhar na direção da beleza, da vida plena, da alegria, da Eko Porã. Em meio à tormenta, cantamos, dançamos e plantamos jardins porque confiamos, como Jeremias, diante da sua terra arrasada, que ainda vingarão flores neste lugar...


Feliz primavera! Viva Abya Yala..

*Jornalista


25 de setembro de 2007

Memórias de Alice

Frei Betto*

Se me é dado recordar, puxo lá no fundo da memória. Só deslembranças mais profundas, as que se refugiam atrás do inconsciente, carregadas de dor, revestidas de traumas, que preferem se esconder nos recantos mais obscuros do olvido. Porque outras eu sei guardar na lembrança. São as que permanecem tatuadas no coração, enraizadas no cipoal de sentimentos, impregnadas na superfície da pele.


Já viu, Alice, alguém esquecer o calor das mãos amadas, o beijo afetuoso, o olhar acolhedor, o sorriso de alvíssaras? Rodam-me a gargalhada do avô, ouvir a piada contada pelo tio, observando a espuma subir no copo enquanto a cerveja descia; o cheiro apetitoso da quitanda de seu Nezinho, florida de verduras e colorida de legumes; o silvo agudo da roda pétrea do amolador de facas se anunciando na esquina.

Também jamais se me apagam as lembranças da infância, não todas, mas sim aquelas que me fizeram dar conta de mim, saber que eu sou eu, fatos, episódios, eventos que me serviram de espelho no qual refleti essa personalidade moldada no tecido cotidiano da vida. Porque a gente não nasce sabendo de si. Nasce exilado de si. A sabença vem aos poucos, vem pelo olhar do outro, vem pelo carinho acalentador, e também pelo golpe desferido na face, o horror, o grito ofensivo, a ferida aberta na alma pela ponta da maledicência.

Quando a linha invisível do espaço que nos cerca é feita de bem-querer, o nosso lado de dentro também se faz de generosidade. Mas quando são fios eletrizados a nos causar permanente tensão, somos impelidos a romper a linha, destroçá-la, na ânsia de liberdade ilimitada. Reside aí a fonte maligna de todas as guerras.

Quem nasce tropeçado tende a atropelar os demais. Essa memória negativa nem é conveniente, porque se abriga nas dobras da irrazão, na ponta áspera de nosso lado vulcânico, lá onde o limite do humano se desembesta em fera, no resgate ancestral, atávico, dos bichos medonhos que nos coabitam e constituem a mais profunda raiz genética do nosso ser.

Sabe, Alice, eu às vezes tenho medo de minhas memórias. Elas ficam guardadas em mim como se numa caixa muito bem trancada e cujas chaves joguei no mar. E não falo apenas das memórias retorcidas, as que expõem minha face disforme no espelho da alma, carregadas de culpa, não da culpa da transgressão, e sim da culpa da omissão, a que se reveste da máscara da indiferença, do descaso, como se a minha vida fosse um rio capaz de fluir sem prestar atenção aos afluentes. Falo também das lembranças saudáveis, luminescentes, gratificantes, as que exaltam o ego e nos delineiam a auto-estima. Porque não se me apraz olhar para trás. Não quero jamais ser o que fui, quero ser o que não fui, fiel à minha identidade mais profunda, a que se esconde nas cavernas secretas do meu ser e aspira pela transcendência.

Não sou de nostalgias, de reminiscências, de cavucar o passado para maldizer o presente. Sou de ânsias de futuro, movido a utopias. Contudo, prometi a você que contaria o que sucedeu naqueles anos sombrios. Você me disse que precisa saber, penetrar fundo os mistérios de sua própria família, recolher os cacos espalhados pelo passado e tentar reconstruir o mosaico. Assim, tantos estilhaços que hoje lhe pulverizam a memória talvez se reajuntem e formem um conjunto conexo, um bordado que, ainda pelo avesso, só exibe linhas desarmônicas, entrecruzadas, impedindo-a de contemplar o desenho configurado do outro lado.

Hoje você completa 20 anos. E é preciso que se saiba neta de um herói. Seu avô são todos aqueles que abandonaram as salas de aula e ousaram enfrentar uma ditadura militar munidos de idealismo, generosidade, confiança em si e no futuro. Graças a eles, Alice, você agora não precisa olhar para trás nas ruas, nem desconfiar do colega de curso ou do vizinho a espreitar-lhe pela janela, e tentar adivinhar o que significam tantas receitas estampadas nos jornais e temer o carro de polícia cuja sirene lhe afoga os ouvidos às suas costas.

Alice, felicidade é não se envergonhar da própria história e cultivar, nos campos profícuos da subjetividade, amorosas orquídeas irrompidas, como por milagre, nos troncos ásperos dessa conflitiva existência.


[Autor de "Batismo de Sangue" (Rocco), entre outros livros]
*Frei dominicano.

24 de setembro de 2007

Pra começar a semana inspirada!

Silêncio Amoroso
"Preciso do teu silêncio cúmplice sobre minhas falhas. Não fale.Um sopro, a menor vogal pode me desamparar. E se eu abrir a boca minha alma vai rachar.O silêncio, aprendo, pode construir. É um mododenso/tenso - de coexistir. Calar, às vezes, é fina forma de amar."

Affonso Romano de Sant'Anna



21 de setembro de 2007

O caminho para Samarra


Leonardo Boff*

Um soldado da antiga Bassora, na Mesopotânia, cheio de medo, foi ao rei e lhe disse: "Meu Senhor, salva-me, ajuda-me a fugir daqui; estava na praça do mercado e encontrei a Morte vestida toda de preto que me mirou com um olhar mortal; empresta-me seu cavalo real para que possa correr depressa para Samarra que fica longe daqui; temo por minha vida se ficar na cidade". O rei fez-lhe a vontade. Mais tarde o rei encontrou a Morte na rua e lhe disse: " O meu soldado estava apavorado; contou-me que te encontrou e que tu o olhavas de forma estranhíssima". "Oh não", respondeu a Morte, "o meu olhar era apenas de estupefação, pois me perguntava como esse homem iria chegar a Samarra que fica tão longe daqui, porque o esperava esta noite lá".
Essa estória é uma parábola da aceleração do crescimento feito à custa da devastação da natureza e da exclusão das grandes maiorias. Ele nos está levando para Samarra. Em outras palavras: temos pouquíssimo tempo à disposição para entender o caos no sistema-Terra e tomar as medidas necessárias antes que ela desencadeie conseqüências irreversíveis. Já sabemos que não podemos mais evitar o aquecimento global, apenas impedir que seja catastrófico. No âmbito dos governos, não se está fazendo nada de realmente significativo que responda à gravidade do desafio. Muitos crêem na capacidade mágica da tecno-ciência: no momento decisivo ela seria capaz de sustar os efeitos destrutivos. Mas a coisa não é bem assim. Há danos que uma vez ocorridos produzem um efeito-avalanche.
A natureza no campo físico-químico e mesmo as doenças humanas nos servem de exemplo. Uma vez desencadeada, não se pode mais bloquear uma explosão nuclear. Rompidos os diques de Nova Orleans nos USA, não é mais possível frear a invasão do mar. Na maioria das doenças humanas ocorre a mesma lógica. O abuso de álcool e de fumo, o excesso na alimentação e a vida sedentária começam a princípio produzindo efeitos sem maior significação. Mas o organismo lentamente vai acumulando modificações, primeiramente funcionais, depois orgânicas e, por fim, atingindo certo patamar, surge uma doença não mais reversível.
É o que está ocorrendo com a Terra. A "colônia" humana em relação ao organismo-Terra está se comportando como um grupo de células que, num dado momento, começa a se replicar caoticamente, a invadir os tecidos circundantes, a produzir substâncias tóxicas que acaba por envenenar todo o organismo. Nós fizemos isso, ocupando 83% do planeta.O sistema econômico e produtivo se desenvolveu já há três séculos sem tomar em conta sua compatibilidade com o sistema ecológico. Hoje nos damos conta de que ecologia e modo industrialista de produção que implica o saque desertificante da natureza são contraditórios. Ou mudamos ou chegaremos à Samarra, onde nos espera algo sinistro.
A Terra como um todo é a fronteira. Ela coloca em crise os atuais modos de produção que sacrificam o capital natural e as formações sociais construídas sobre o consumismo, o desperdício, o mau trato dos rejeitos e a exclusão social. Três problemas básicos nos afligem: a alimentação que inclui a água potável, as fontes de energia e a superpopulação. Para cada um destes problemas não temos soluções globais à vista. E o tempo do relógio corrre contra nós. Agora é o momento de crise coletiva que nos obriga a pensar, a madurar e a tomar decisões de vida ou de morte.

*Teólogo e professor emérito de ética da UERJ

19 de setembro de 2007

A privatização do setor elétrico está (sorrateiramente) de volta?

Frei Betto*

Não há dúvida de que, no governo Lula, a malha de transmissão de energia elétrica cresceu muito mais do que em qualquer outro. "Nunca na história deste pais" se investiu tanto no setor. Isso é positivo e garante o fornecimento de energia elétrica às diversas regiões do país. O consumidor, hoje, ganha. Ganhará sempre?
O governo federal promove, via ANEEL, leilões para expandir o sistema de transmissão elétrica do país. Nos cinco leilões entre 2000 e 2002 (era FHC), o deságio baixíssimo assegurou altos rendimentos às empresas privadas. Em média, lucravam 20% sobre o valor do investimento. E não se permitia que empresas estatais, como Furnas, participassem dos leilões. O governo impediu Furnas de participar dos leilões das linhas de transmissão Ouro Preto-Vitória, Norte-Sul2, Itumbiara-Marimbondo etc.. Quando Furnas obteve permissão de participar foi porque não houve interesse do capital privado. E a estatal saiu no lucro.
Agora, no governo Lula, os ágios dos seis leilões subiram de 30 a 50%, esfriando a farra dos elevados ganhos do setor privado. As empresas arremataram linhas a serem construídas por preços bem menores do que se fazia no passado, e muito abaixo do preço de referência da ANEEL.
Bom para o consumidor brasileiro que, todo mês, paga na conta os custos de geração, transmissão e distribuição de energia, e mais os impostos embutidos. O que também favorece a competição entre as empresas do setor. Entretanto, o filé mignon fica com as grandes empresas espanholas (Abengoa, Isolux, Elecnor, Cobra e Cymi), e a colombiana Isa.
No setor de transmissão os riscos do investidor são pequenos. Em média, as grandes linhas de transmissão leiloadas são construídas em cerca de 20 meses. É rápido o retorno do capital investido. Já as hidrelétricas exigem anos de estudos, questões complexas de compensação ambiental, e tempo de construção de 3 anos, para as pequenas, e 5 para as médias; ou mais, para as gigantes, como a do Rio Madeira.
Este retorno financeiro, calculado, está embutido no lance do leilão. O ganhador, a curtíssimo prazo, já começa a receber seu capital de volta, em prestações mensais garantidas por 30 anos (antes corrigidas pelo IGPM e, agora, pelo IPCA). Daí a entrada maciça de empresas estrangeiras.
Essas empresas podem ser financiadas diretamente pelo BNDES (desde 2003 já captaram cerca de R$ 5,5 bilhões); contratar a si mesmas na execução das obras e negociar preços; refinanciar o capital próprio (equity) investido no empreendimento (o BNDES financia cerca de 70%; a empresa entra com 30% - podendo obter financiamento fora do Brasil); atuar em bloco (quem vai controlá-las?) e, se desejarem, não operar as linhas ganhas, negociando-as.
Já as empresas do setor elétrico estatal não têm liberdade para negociar com seus fornecedores de serviços e equipamentos, pois se regem pela lei de licitações, a Lei 8666. Tudo que fazem deve ser público e transparente. E Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf estão proibidas, pelo governo, de serem financiadas diretamente pelo BNDES. Se quiserem obter financiamento do BNDES, devem se associar a empresas privadas na proporção de 49% para as estatais e 51% para as privadas!
É a desestatização anunciada, a prazo, mas certa, do setor de transmissão, a espinha dorsal do setor elétrico brasileiro. As linhas ficarão em mãos de empresas privadas ou mistas (sob controle do capital privado).
Já as pequenas linhas estão ao alcance das estatais, que podem adquiri-las com capital próprio. Um fenômeno curioso: uma estatal federal pode se associar a uma estatal estadual - desde que esta detenha 51%. A Cemig, majoritária, e Furnas, minoritária, ganharam juntas a pequena linha de transmissão (75 km) entre a usina de Furnas e a cidade de Pimenta (MG). É o que resta às estatais. Com capital próprio, Furnas controla apenas linhas de transmissão pequenas, como a de Campos-Macaé (92 km) e a Tijuco Preto-Itapeti-Nordeste (50 km).
A privatização soma-se à desnacionalização
O que o consumidor gostaria de entender é por que as estatais federais são minoritárias nas grandes linhas? A resposta, simples, é de fazer corar quem esperava do PT um governo minimamente nacionalista: não se permite que sejam financiadas pelo BNDES. E não podem captar dinheiro fora do país, como fazem as transnacionais. Assim, sobra às empresas federais apenas a possibilidade de, nos leilões, fazerem lances, com capital próprio, em linhas pequenas.
Entre 2000 e 2002, foram realizados investimentos no setor de transmissão da ordem de R$ 3,8 bilhões, com deságios mínimos. À época, empresas estrangeiras obtiveram 49% das linhas leiloadas; as empresas privadas brasileiras, 36%; as parcerias estatais/privadas, 15%. As estatais, sozinhas, abocanharam apenas 13,5% dos trechos leiloados.
Já entre 2003 e 2006, quando os investimentos totalizaram cerca de R$ 9,5 bilhões, as empresas estrangeiras avançaram para 65% dos trechos leiloados. As associações de empresas estatais e privadas (estas sempre majoritárias) alcançaram 25% das linhas. As estatais recuaram e as empresas nacionais não agüentaram a concorrência.
Uma análise dos leilões de 2006, onde os investimentos foram de R$ 1,8 bilhão, mostra que as empresas estrangeiras conseguiram vencer em 84% dos trechos de linhas de transmissão leiloados.
Ora, graças às estatais, o Brasil construiu, com absoluto sucesso, um dos maiores sistemas de produção, transmissão e distribuição de energia elétrica do mundo. A concorrência, como está agora, é desigual. As estatais concorrem com as empresas privadas sem igualdade de condições. Estão perdendo terreno. Tudo indica que, a prazo, as estrangeiras dominarão o setor. O reflexo disso aparecerá no bolso do consumidor e na soberania do país: energia mais cara, e mais riqueza produzida aqui levada para o exterior pelas transnacionais.
[Autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros].


* Frei dominicano.

18 de setembro de 2007

Reflexões...

"Você pode descobrir mais sobre uma pessoa em uma hora de brincadeira do que em um ano de conversa." (Platão).

Constatei isso nesta semana, as pessoas se revelam... Por um lado é positivo, por outro é muito estanque... Por que não somos espontâneos a vida toda?!

"Nunca diga "te amo" se não te interessa. Nunca fale sobre sentimentos se estes não existem. Nunca toque numa vida se não pretende romper um coração. Nunca olhe nos olhos de alguém se não quiser vê-lo se derramar em lágrimas por causa de ti. A coisa mais cruel que alguém pode fazer é permitir que alguém se apaixone por você quando você não pretende fazer o mesmo."
(Mario Quintana)

Isso é muito sério mesmo! Sem querer julgar, mas vejo às vezes, alguns casais que banalizaram mesmo o "te amo". Dizem sem sentir... Fiquei pensando o quanto demorei a dizer "te amo", poucas pessoas ouviram de mim.

"Esses que puxam conversa sobre se chove ou não chove - não poderão ir para o Céu! Lá faz sempre bom tempo..."(Mario Quintana)

Amei essa frase, hoje que está chovendo então...

17 de setembro de 2007

Opinião dos outros....

Neste final de semana conversamos muito sobre o estilo de vida e as opções que algumas pessoas de nossa família e amigos fizeram...

Após pensar e falar algumas coisas eu me perguntei o seguinte, será que importa a nossa opinião??!!

Você se importa com a opinião que os outros têm a seu respeito?

Temos conhecidos que sofrem se não tiverem uma opinião alheia, parece que necessitam de uma confirmação pra realizar coisas!
No entanto, se a opinião dos outros sobre você é decisiva, vamos pensar um pouco sobre o quanto isso pode lhe ser prejudicial.
O primeiro sintoma de alguém que está sob o jugo da opinião alheia, é a dependência de elogios.
Se ninguém disser que o seu cabelo, a sua roupa, ou outro detalhe qualquer está bem, a pessoa não se sente segura.
Se alguém lhe diz que está com aparência de doente, a pessoa se sente amolentada e logo procura um médico.
Se ouve alguém dizer que está gorda, desesperadamente tenta diminuir peso.
Mas se disserem que é bonita, inteligente, esperta, ela também acredita.
Se lhe dizem que é feia, a pessoa se desespera. Principalmente se não tem condições de reparar a suposta feiúra com cirurgia plástica!!!
Existem pessoas que ficam o tempo todo à procura de alguém que lhes diga algo que as faça se sentir seguras, mesmo que esse alguém não as conheça bem.
Há pessoas que dependem da opinião alheia e se infelicitam na tentativa de agradar sempre.
São mulheres que aumentam ou diminuem seios, lábios, bochechas, nariz, para agradar seu pretendido. Como se isso fosse garantir o seu amor.
São homens que fazem implante de cabelo, modificam dentes, queixo, nariz, malham até à exaustão, para impressionar a sua eleita.
E, quando essas pessoas, inseguras e dependentes, não encontram ninguém que as elogie, que lhes diga o que desejam ouvir, se infelicitam e, não raro, caem em depressão.
Não se dão conta de que a opinião dos outros é superficial e leviana, pois geralmente não conhecem as pessoas das quais falam.
Não acredite em tudo o que falam a seu respeito. Não se deixe impressionar com falsos elogios, nem com críticas infundadas.
Seja você. Descubra o que tem de bom em sua intimidade e valorize-se. Ninguém melhor do que você para saber o que se passa na sua alma.
Procure estar bem com a sua consciência, sem neurose de querer agradar os outros, pois os outros nem sempre dão valor aos seus esforços.
A meditação é excelente ferramenta de auto-ajuda. Mergulhar nas profundezas da própria alma em busca de si mesmo é arte que merece atenção e dedicação.
Quando a pessoa se conhece, podem emitir dela as opiniões mais contraditórias que ela não se deixa impressionar, nem iludir, pois sabe da sua realidade.
Nesses dias em que as mídias tentam criar protótipos de beleza física, e enaltecer a juventude do corpo como único bem que merece investimento, não se deixe iludir.
Você vale pelo que é, e não pelo que tem ou aparenta ser.

O importante mesmo, é que você se goste. Que você se respeite. Que se cuide e se sinta bem.
A opinião de alguém só deve fazer sentido e ter peso, se esse alguém estiver realmente interessado na sua felicidade e no seu bem-estar.

Boa Semana!



16 de setembro de 2007

A Bacia de Pilatos

Leonardo Boff*

A nação está perplexa e indignada. Na cara da maioria dos políticos e, particularmente, dos jornalistas que acompanharam o caso do Senador Renan Calheiros e sabiam as manobras escusas que usava a partir de seu cargo de presidente da Casa, para se manter no poder, se estampava decepção e abatimento. E com razão, pois, o Senado se transformou num sinédrio, cheio de herodianos, aliados do poder dominante. Esses votaram a favor e 6 se abstiveram. Exatamente o número que Renan precisava para escapar-se da punição. Abster-se é dizer não à cassação. Supõe-se que muitos destes votos, secretos, vieram do PT e aliados. O Senador Mercadante revelou seu voto de abstenção. A líder do PT no Senado, Ildeli Salvati, cabalava votos em favor de Renan e deve ter se abstido, facilitando a vitória do acusado. A propósito de falta de decoro por permitir que um lobista pagasse suas contas pessoais referentes ao filho que tivera com sua amante ­ isso se chamava antigamente de adultério público - descobriram-se muitas outras irregularidades graves, atestadas pela polícia federal e pelo jornalismo investigativo da televisão. Esta foi ao local, em Alagoas, documentou em som e em cores as mentiras e falsas alegações de Calheiros o que comprovava ainda mais sua falta de decoro. Além do mais, mentiu aos Senadores e sonegou informações e documentos ao conselho de ética.Aliados do absolvido falaram em vitória da democracia. Que democracia? Esta, convencional no Brasil, encurtada e farsesca, montada em cima de conchavos, do uso do poder público em benefício próprio, infectada de tráfico de influência e de desvio de dinheiros públicos?O que envergonha os cidadãos é verem Senadores, alguns velhos provectos, sem qualquer dignidade, verdadeiros mafiosos do poder, voltarem as costas à sociedade e fazerem-se cegos e surdos ao clamor das ruas. Estão tão enjaulados em seus privilégios na redoma do Senado que nem lhes importa o que a mídia e a opinião pública pensam deles.Mas, o que envergonha mesmo é a recaída de membros do PT. São pecadores públicos contumazes. Já haviam antes enviado a ética nem sequer para o limbo, mas diretamente para o inferno. Agora repetiram o ato pecaminoso. Por isso, são desprezíveis como Pilatos. Este se acovardou diante do povo e condenou Jesus. Mas, antes fez um gesto que passou à história como símbolo de pusilanimidade, de covardia e de falta de caráter. Diante do povo, lavou as mãos com água. Essa bacia de Pilatos foi ressuscitada no Senado. Mas a água não é água. São lágrimas dos indignados, dos cansados de ver injustiças e dos dilacerados diante da contínua impunidade. A "onorebile famiglia Calheiros" tem novos membros em sua máfia. Todos os que se abstiveram, podem acrescentar a seus nomes o sobrenome de Calheiros. Como revelou publicamente seu voto, o Senador Aloísio Mercadante merece agora ser chamado de Aloisio Mercadante Calheiros. Pelo esforço da argumentação em favor da não cassação de Renan, a Senadora Ildeli Salvatti merece que lhe apodemos de Ideli Salvatti Calheiros. Ela fez a figura inversa da mulher do covarde Pilatos que o advertiu: "não te comprometas com este justo, pois sofri muito hoje em sonhos por causa dele". Ela e outros devem estar sofrendo muito, sim, roídos pela má consciência. Esse sofrimento transparece em seus olhos revirados e em seus rostos desfigurados.O povo não merece ser representado por espíritos menores, faltos de ética, desavergonhados e esquecidos de que são meros delegados do poder popular. Que mostrem a cara, que falem ao povo, que se expliquem por quê, diante de tantas provas dos relatórios da comissão de ética e do clamor das ruas, puderam agir de forma tão traiçoeira.


*Teólogo

14 de setembro de 2007


Desejo um final de semana cheio de cores e
com muito sabor pra todos vocês!!
ONU e Direitos dos Povos Indígenas

Azelene Kaingáng*

Assembléia Geral da ONU vota hoje (13 de setembro) a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas
A votação prevista para hoje, dia 13 de setembro, no plenário da Assembléia Geral das Nações Unidas poderá colocar um ponto final em mais de 20 anos de discussões e negociações entre representantes indígenas de todo o mundo e os Estados membros da ONU, sobre a Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas.
O texto da Declaração foi adotado em 2006, pelo recém criado Conselho de Direitos Humanos da ONU, porém ao ser remetido para a Assembléia Geral do mesmo ano, os Países africanos liderados por Botswana, Namíbia e Nigéria, apoiados por Estados Unidos, Canadá, Rússia, Nova Zelândia e Austrália, impediram a sua adoção sob o argumento de que tinham problemas com o texto, desde então, nos últimos 12 meses se levaram a cabo intensas negociações entre Povos Indígenas, Estados Amigos da Declaração, entre eles o Brasil, e os Países Africanos.
Finalmente, chegaram a um consenso depois de emendarem 4 (quatro) parágrafos preambulares e 5 (cinco) artigos dispositivos no texto da Declaração, no sentido de contemplar algumas das preocupações dos Estados em relação a sua soberania, integridade territorial, militarização, recursos naturais e o princípio do consentimento prévio, livre e informado.
Muitas Organizações Indígenas no mundo apóiam a adoção da Declaração, embora não concordem com as mudanças realizados pelos Estados, entendem que mesmo afetando algumas questões o texto preserva muito do que foi conquistado pelos Povos Indígenas durante o processo negociador.
É hora da ONU reconhecer a dívida histórica que os Países possuem para com os Povos Indígenas e manifestar esse reconhecimento através da adoção definitiva desse instrumento internacional de afirmação e garantia dos direitos humanos dos Povos Indígenas. A vida e o futuro de mais de 370 milhões de indígenas do mundo, depende da aprovação e da implementação da Declaração das nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
A Declaração além de plantar novas bases nas relações entre os Estados Nacionais e os Povos Indígenas, busca eliminar progressivamente a discriminação, a exclusão e o preconceito de que são vítimas esses Povos em todo o mundo, como conseqüência do processo de colonização que sofreram durante séculos. Prevê ainda a garantia dos direitos humanos fundamentais, como o respeito às diferenças culturais e às tradições, e também o direito de manter e fortalecer as suas próprias instituições políticas de decisão.


*Socióloga. Membro do Warã Instituto Indígena Brasileiro. Prêmio Nacional de Direitos Humanos 2006

Que este tipo de cena não se repita!! Aliás, esta foto é da comemoração do 500 anos do BRASIL!!!!!

No dia 11 de setembro minha mãe estava de niver.
Comemoramos dia 12, quarta, com um belo pastelão...
Meu irmão, esse da foto, nos proporcionou momentos de risos com
suas caretas... Ô Paulinho!








Hoje recebi notícias da Melissa, filha da Mariglei. Está cada vez mais fofa!!! Cada
vez que minhas amigas me mandam foto de seus filhos me dá um nervoso!!!
Vejo como o tempo passou, alguns anos atrás tínhamos vergonha de namorar!!!!!!!!!!
Mas é muito ver todo mundo "encaminhado", feliz e realizado com suas famílias!

Bom, hoje sexta-feira, finalmente terei um final de semana de folga...
Mais tarde escrevo mais!

13 de setembro de 2007

Homenagem às amigas

Minha amiga Magda adorou a imagem de "entrada" do blog. rsrsrs
Está ali em homenagem a Janice.
Lá em casa esses dias começou uma discussão sobre as tais "gorduras trans", me inspirei para pôr o nome no endereço do blog. Por quê? Olha a definição...

"As gorduras trans são um tipo especial de ácido graxo, formado a partir de ácidos graxos insaturados. Em outros termos, são um tipo específico de gordura formada por um processo de hidrogenação natural (ocorrido no rúmen de animais) ou industrial. Estão presentes principalmente nos alimentos industrializados. Os alimentos de origem animal como a carne e o leite possuem pequenas quantidades dessas gorduras."

O pior vem agora...

"Estão presentes em muitos alimentos industrializados, como biscoitos, bolos confeitados e salgadinhos. A gordura trans é muito utilizada nestes produtos por aumentar sua validade e dar mais crocância, mas é extremamente nociva para o organismo. Embora alguma gordura trans seja encontrada na natureza (no leite e gordura de ruminantes como vaca e carneiro), por influência de uma bactéria presente no rumén desses animais, a maioria é formada durante a manufatura de alimentos processados."

TUDO QUE É GOSTOSO TEM ISSO!!!!!!!!

Janice, não tem saída... Dependemos das tais gorduras trans...

Lula

"Interessa é que o Senado volte a funcionar", diz Lula

Interessante como as coisas mudam... Pôxa que diferença de visão e opções do Lula.
Em pensar que já o acompanhei em seus discursos e visitas em minha cidade.
Decepcionante!

Bom, mas a vida tem que seguir...

As fases da lua


Frei Betto*

Muito cedo gravou-se em mim o sentimento do mundo. Meus olhos, dilatados pela fé, polidos pelo pós-hegelianismo de Marx, enxergaram a pirâmide social invertida. Consumiu-se minha juventude na embriaguez da utopia. Dela comungavam tantos companheiros e companheiras movidos pelo ardente desejo de morder a lua.
Épico o nosso sonho de remover as travas da desvida. Singular aquela estóica dedicação, despojada de toda ambição pessoal, disposta a reinventar o mundo. Tínhamos a ousadia de romper parâmetros, despidos de moralismos e sensíveis à morte e vida Severina. Lutávamos atentos aos clamores da Revolução de Outubro, à Longa Marcha de Mao ao cruzar as pontes de nossos corações, aos barbudos de Sierra Maestra que arrancavam baforadas de nosso alento juvenil, à vitória vietnamita selando-nos a certeza de que arrebataríamos o futuro. A lua seria o nosso troféu. Haveríamos de escalar suas montanhas e, lá em cima, desfraldar as bandeiras da socialização compulsória.
Os condenados da Terra arranchavam-se sob o caravansará de nossos ideais e, em breve, saberíamos conduzi-los aos mananciais onde correm leite e mel...
Caiu a noite, a lua se apagou, a nação, pisada pelas botas, abortou primícias e promessas. Trocamos a sala de aula pelo combate destemido, a caneta pelas armas, a garganta a ruminar convicta: "Venceremos!"
O terror do Leviatã se abateu sobre nós, os gritos de dor ecoaram das masmorras, vidas preciosas ceifadas no carrossel das sevícias, corpos despedaçados e desaparecidos nos labirintos do arbítrio. Ainda assim, a lua não sangrou.
Rumo à aurora, demos as mãos à multidão peregrina imbuída da devoção democrática. Nas periferias, o sorriso se abria, a consciência despertava, a mobilização florescia. Até que brilharam os raios fúlgidos e o esplendor da lua iluminou-nos a esperança.
Na oficina dos sonhos, forjamos ferramentas apropriadas ao parto do novo Brasil. A luta sindical consubstanciou-se em projeto partidário, a crença pastoral multiplicou-se em células comunitárias, os movimentos sociais emergiram como atores no palco dominado pelas sinistras máscaras dos que jamais conjugaram o verbo partilhar. Cuba, Nicarágua, El Salvador... o olhar impávido do Che... a irredutível teimosia de Gandhi... a sede de justiça dessedentada nas fontes límpidas da ética. Jamais seríamos como eles. Em tempos de chuva, a água sobe rápido e inunda ruas, casas, cidades. Cegos pela miragem, não percebemos o lento e imbatível sopro do vento. A areia fétida, acumulada à soleira da porta, dia após dia subia mais um palmo. Galgamos degraus investidos de mandato popular, fomos entronizados na cozinha de Maquiavel, havia chegado a hora de quem tanto esperou acontecer. Intrépidos, alguns de nós decidiram cavalgar soberbos, convencidos de que o caminho mais curto entre sonho e realidade passa pelo mágico som do tilintar das moedas.
Por que não se aventurar pelas mesmas sendas trilhadas pelo inimigo, já que ele se perpetua com tanta força? Qual o segredo dos cabelos de Sansão? Os pobres caíram no olvido, a sedução do poder fez a lua arder em chamas. Ícaros impenitentes, não se deram conta de que as asas eram de barro.
A sofreguidão esvaziou projetos, a gula cobiçosa devorou quimeras. O pragmatismo acelerou a epifania dos avatares do poder. O conluio enlaçou históricos oponentes, adversários coligaram-se, e aliados foram defenestrados nessa massa informe que, destemperada de ética, alicerça o Leviatã.
Ainda assim, há quem, sob a lua apagada, não tema perseguir pontos de luz na escuridão. Por alguma parte trafega a lanterna de Diógenes. Triste, contudo, ver antigos companheiros na condição de réus de tramóias eleitoreiras e financeiras.
Hoje, a história, estuprada pelo neoliberalismo, engravida-se de sonhos medíocres. A utopia escorre pelo ralo. A lua míngua, a estrela já não refulge.
Dói em mim tanto desacerto. Os sonhos de uma geração trocados por um prato de lentilha. Aguardo, agora, a lua nova.


[Autor de "A mosca azul - reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros].

*Frei dominicano.

12 de setembro de 2007

Olá.
Resolvi re-começar com o blog.
Senti falta de escrever...